Por Quinton Nicuete
O Tribunal Administrativo (TA) detectou graves irregularidades nas contas do Estado referentes a 2024, último ano da governação de Filipe Nyusi. O órgão de fiscalização financeira aponta falhas de transparência, desvio de receitas e falta de coordenação entre instituições públicas, sobretudo no sector do gás e do petróleo.
Segundo o relatório, uma das situações mais preocupantes envolve a empresa Mozambique Rovuma Venture, que declarou o pagamento de 33,6 milhões de dólares em impostos sobre a produção de petróleo. Contudo, apenas 24,6 milhões foram efetivamente registados no Orçamento do Estado. O paradeiro de mais de 9 milhões de dólares continua sem explicação.
De acordo com o TA, a ausência de documentos oficiais que comprovem a transferência da totalidade das receitas para a Conta Única do Tesouro confirma a não canalização desses valores ao Fundo Soberano, contrariando as normas legais. O órgão recomenda que o Governo assegure maior clareza e rigor na elaboração da Conta Geral do Estado, enquanto o Executivo promete regularizar a situação.
O Tribunal critica ainda a fraca articulação entre o Instituto Nacional de Petróleos, o Instituto Nacional de Minas e a Autoridade Tributária, o que permite que várias empresas operem fora do controlo tributário, prejudicando a arrecadação de impostos. O TA observa também que algumas concessionárias, como a Total Energies, têm ignorado as exigências do regulador e apresentado relatórios com saldos “irreais”.
Em 2024, a Total Energies declarou custos superiores a 1,1 mil milhões de dólares, o que, segundo o Tribunal, pode atrasar o início da produção e reduzir as futuras receitas do Estado. O TA recomenda uma vigilância mais apertada sobre a empresa, sublinhando que parte dos custos reportados não é aceite e poderá influenciar negativamente a partilha do chamado “petróleo-lucro”.
O relatório inclui ainda apontamentos sobre a Presidência da República. O TA identificou despesas de mais de 520 milhões de meticais no projecto de reabilitação e apetrechamento das infraestruturas presidenciais e um empréstimo interno de 1,3 mil milhões de meticais que não consta no Plano Económico e Social nem no Orçamento do Estado.
Outra falha registada diz respeito ao Banco de Moçambique, acusado de alterar a metodologia de reporte das reservas internacionais, o que, segundo o Tribunal, distorce a leitura sobre a real robustez da moeda externa e a disponibilidade de divisas.
O documento revela também que a dívida pública atingiu um valor recorde de cerca de um trilhão de meticais em 2024, ultrapassando os limites de sustentabilidade definidos pelo Fundo Monetário Internacional e pelo Banco Mundial.
As conclusões do TA colocam em causa a transparência da gestão pública no último ano do Governo de Nyusi e lançam um alerta sobre a necessidade urgente de reforçar o controlo das receitas provenientes dos recursos naturais, sob pena de o país continuar a perder milhões que deveriam servir o desenvolvimento nacional. (Moz24h)
