Num país onde a cultura autoritária da classe dirigente promoveu e ainda pro- move o fechamento de espaço cívico e a repressão das liberdades e direitos fundamentais, era de esperar que a carta de Samora Machel Jr. dirigida aos “camaradas” da Frelimo suscitasse reacções hostis por parte de pessoas próximas ao poder do dia. O que não era expectável é que as reacções viessem em formato de ameaças por parte do Comando-Geral da PRM de processar judicialmente o filho do primeiro Presidente de Moçambique.
No lugar de reflectir seriamente sobre a sua actuação violenta contra membros de partidos da oposição, a Polícia prefere ameaçar com processo judicial Samora Machel Jr. por ter afirmado que foram quatros pessoas (e não uma) atingidas mortalmente em Chiúre. Como se o facto de ter sido uma pessoa morta minimizasse o grave problema de violação do mais precioso direito humano: o direito à vida. E a Polícia limitou-se a lamentar a morte e não desencadeou nenhuma acção para responsabilizar o agente que disparou arma de fogo contra pessoas indefesas e muito menos para prestar assistência à família da vítima.
Um dia depois da publicação da carta de Samora Machel Jr.1 na qual lamenta e demarca-se da violência policial e da viciação de resultados eleitorais a favor da Frelimo, o Comando-Geral da PRM reagiu com uma ameaça dirigida ao filho do primeiro Presidente de Moçambique independente. Através do seu porta-voz (Orlando Mudumane), o Comando-Geral da PRM nega que tenha assassinado a tiro quatro pessoas em Chiúre, tal como vem escrito na carta, e diz que vai demandar judicialmente Samora Machel Jr. pela acusação.
Na sua carta, o filho de Samora Machel começa por dizer que “quatro (4) cidadãos foram mortos a bala em Chiúre por conta de diferendos eleitorais, foram mortos pelas balas disparadas pela polícia da República de Moçambique”, uma afirmação baseada em relatos que circularam no dia 12 de Outubro dando conta de quatro assassinatos provocados pela Polícia durante os protestos da Renamo contra alegada fraude eleitoral na autarquia de Chiúre, em Cabo Delgado.
“A Polícia da República de Moçambique lamenta, desmente e condena veementemente a posta a circular nas redes sociais e posteriormente difundida por alguns órgãos de comunicação social, dando conta que a Polícia teria alvejado mortalmente quatro indivíduos no distrito de Chiúre, na província de Cabo Delgado”. A “Polícia reconhece e lamenta profundamente a morte de um indivíduo de 19 anos de idade no dia 12 de Outubro, alvejado acidentalmente quando a Polícia viu-se na contingência de actuar para pôr termo a um grave motim protagonizado por membros e simpatizantes de partidos políticos” .
A informação da morte de uma e não de quatro pessoas já tinha sido confirmada pelo Comando da Polícia em Cabo Delgado, que alegou que um jovem de 19 anos tinha sido atingido de forma acidental.3 Como tem sido hábito, a Polícia limitou-se a lamentar a morte e não desencadeou nenhuma acção para responsabilizar o agente que disparou arma de fogo contra pessoas indefesas e muito menos para prestar assistência à família da vítima.
O Comando-Geral da Polícia preferiu ameaçar com processo judicial Samora Machel Jr. por ter afirmado que foram quatros pessoas atingidas mortalmente em Chiúre. Como se o facto de ter sido uma pessoa morta minimizasse o grave problema de violação do mais precioso direito humano: o direito à vida. Antes de avançar com ameaças, a PRM devia reflectir seriamente sobre a sua actuação perante manifestações de activistas sociais e membros de partidos da oposição, as vítimas preferenciais da repressão policial. Nas marchas promovidas pelo partido no poder, assume uma postura pacífica e protege as pessoas envolvidas. Mas quando se trata da oposição, a Polícia limita a circulação, usa gás lacrimogéneo e armas de fogo para dispersar pessoas. (CDD)