Este é o terceiro tumulto em que líderes comunitários são acusados de receber supostos quites do vibrião e espalhar a cólera na comunidade.
Um sociólogo relaciona o incidente com a insatisfação dos resultados eleitorais.
Um contingente da Polícia foi destacado para resgatar quatro líderes comunitários que tinham sido capturados e agredidos por residentes acusados de distribuir a cólera num bairro de Gurue, explicou à Voz da América, Sider Lonzo, porta-voz da Polícia na Zambézia.
Após a Polícia negociar o resgate, prosseguiu Lonzo, e já com os líderes comunitários na viatura policial, a multidão voltou a se rebelar e, furiosa, começou a lançar pedras, arcos e flechas contra os passageiros da viatura, tendo sido feridos quatro agentes da Polícia e igual número de líderes comunitários.
“Um agente teve ferimentos graves e foi socorrido para o hospital onde viria a morrer. Um dos quatro líderes comunitários já tinha sido resgatado inconsciente devido à agressão e continua internado”, contou o porta-voz, anotando que o tumulto foi o mais grave relacionado com a desinformação da cólera.
Síder Lonzo explicou que este é o terceiro caso de boato sobre a distribuição da cólera em Gurué este ano.
Pelo menos oito pessoas foram detidas envolvidas no novo incidente.
Os distritos de Gurué, Gilé e Mocuba, estão a enfrentar um surto de diarreias agudas há duas semanas, que provocou a morte a 10 pessoas.
As autoridades sanitárias da Zambézia, após recolher 21 amostras destes distritos, tendo 17 amostras resultado positivo para cólera, declararam um novo surto da cólera nesta segunda-feira, 6.
Boatos vs justiça
Os principais desafios na resposta à cólera na Zambézia, segundo as autoridades, estão relacionados com o acesso à água potável, higiene, saneamento e recorrentes casos de boatos, em que populares acusam os líderes locais de distribuir a cólera.
A Polícia relatou que este é o terceiro tumulto provocado por boatos de que havia chegado na região um suposto quite do vibrião, e que seria espalhado pelos líderes comunitários.
Entretanto, o sociólogo Bebito Manuel pbserva que, além das desigualdades sociais e o analfabetismo, a população aproveitou-se do boato sobre a “distribuição” da cólera em Gurué para enviar recados sobre a insatisfação dos resultados eleitorais.
“Não se pode associar só ao boato da cólera a pobreza e à falta de educação formal porque temos desigualdades em vários cantos onde não ocorre a desinformação”, começou por explicar Manuel.
O também docente de sociologia na Universidade Licungo, em Quelimane, anota que o “ataque” aos agentes da Polícia e aos líderes comunitários está mais para o contexto eleitoral, que na desinformação da cólera.
“A população se rebelou, e encontrou esse fenómeno, no caso da cólera, para justificar e descarregar um conjunto de frustrações que tem acumulado ao longo do tempo”, vincou Bebito Manuel, realçando que as vítimas são conotadas como ter ligações com o poder político.
Os casos de desinformação sobre a cólera têm sido recorrentes na província da Zambézia.
Em 2016, residestes vandalizaram o centro de tratamento da cólera num dos bairros de Quelimane, onde destruíram e saquearam vários bens, incluindo baldes que serviam para depósito de excrementos. Este caso, que foi o mais mediático, foi julgado e os atores condenados a até quatro anos de prisão por destruição de bens públicos. (VOA)