As últimas eleições autárquicas em Moçambique (2018) demonstraram uma grande capacidade de mobilização dos partidos políticos da oposição na região norte do país, principalmente a Renamo que conseguiu ganhar em seis municípios, dos quais quatro em Nampula, um em Cabo Delgado e um no Niassa. Para 2023, quatro municípios foram acrescentados através de uma proposta pouco clara do Conselho de Ministros, cujo objectivo central passa por recuperar a hegemonia do partido usando a estratégia de escolher actores notáveis ou que controlam negócios ao nível dos municípios para permitir maior apoio.
Mansur Cassamo, empresário de Balama
O processo de escolha dos municípios há muito que não segue o gradualismo que deveria nortear a evolução deste processo. O Conselho de Ministros propôs para as eleições autárquicas de 2023 o acréscimo de 12 novos municípios, sendo quatro na região norte do país, nomeadamente a vila de Balama, onde se encontram as maiores minas de grafite do mundo, e a Ilha do Ibo, em Cabo Delgado; Mossuril, em Nampula; e a sede do posto administrativo de Mecanhelas, no Niassa.
A escolha destes municípios não seguiu critérios transparentes que deveriam permitir a evolução e emancipação do Estado moçambicano, assim como criar maiores possibilidades para o acesso ao dividendo da paz. Mas olhou essencialmente para os interesses particulares do partido Frelimo e dos principais actores envolvidos ao nível local. Aliás, em todos os novos municípios criados desde o início do processo de descentralização política em Moçambique, a Frelimo sempre saiu vitoriosa, mercê da escolha a partir de critérios fixados por este partido, olhando primeiro para o seu nível de preparação para concorrer e ganhar em determinados locais.
Em casos como os de Balama, cuja economia actualmente está centrada na exportação de grafite para o fabrico de batérias de viaturas eléctricas, o Governo chancelou a sua elevação para município. Mas o mesmo não se aplicou ao distrito de Palma, onde operam os maiores projectos de investimento privado em Moçambique, nomeadamente os projectos do gás da Bacia do Rovuma.
A escolha de Balama em detrimento de Palma mostra o quão o processo de descentralização não segue critérios válidos e sustentáveis, mas sim um conjunto de interesses da elite central que se conecta com as elites locais para usurpar as oportunidades de desenvolvimento existentes.
Em termos de cabeças-de-lista, o partido Frelimo preferiu escolher nos municípios da região norte de Moçambique e um pouco por todo país homens de negócios. São os casos dos municípios de Pemba, Mossuril e Balama.
Os empresários visam lucros e são os maiores contribuintes através de pagamento de taxas e impostos aos municípios para a materialização da agenda de governação, entretanto podem se tornar num risco porque através da sua rede de conexões facilitam a fuga ao fisco e a utilização dos meios e recursos do município para o seguimento da sua agenda.
Para o Município de Balama foi escolhido o empresário Mansur Cassamo, com 89% dos votos.
Mansur nunca teve uma aproximação política fervorosa, tendo criado a sua notoriedade através de apoios sucessivos que dava aos governos distritais e pelo facto de ser o principal empresário no distrito de Balama, nas áreas de empreitadas de estradas e construção civil e actua também no fornecimento de bens de primeira necessidade e no ramo de hotelaria e turismo.
Em Pemba, depois de um abandono total dos munícipes por parte do governo municipal nos últimos cinco anos, sob a liderança de Simba
Rui Chong Saw – empresário na Província de Nampula
Motarua, os membros da Frelimo escolheram o Rui Chong Saw – empresário na Província de Nampula Satar Abdul Gani – Empreendedor de Pemba empreendedor Satar Abdul Gani, antigo burocrata da Autoridade Tributária de Moçambique e actualmente Presidente do Baía de Pemba Futebol Clube, com interesses econó- micos na venda de vestuários e farmácias.
Na vila do Ibo, a Frelimo ancorou-se no actual administrador do distrito, Issa Tarmamade, também administrador da cidade de Pemba.
Em Mossuril, na província de Nampula, a escolha recaiu no empresário Rui Chong Saw (Ruca), que exerceu o cargo de edil em Nacala e actualmente exerce o cargo de administrador do distrito de Mossuril. Rui Saw abandonou o município de Nacala tendo deixado avultadas dívidas com fornecedores de serviços.
A economia política adoptada pela Frelimo nos municípios, que se baseia na escolha de figuras sonantes localmente ou empresários já estabelecidos, não é exclusiva da região norte. É uma estratégia usada ao nível nacional nas diferentes eleições, sejam para escolher deputados da Assembleia da República, membros das Assembleias Provinciais e Municipais e até integrantes do Governo.
Satar Abdul Gani – Empreendedor de Pemba
A captura do empresariado para a política permite uma facilitação no financiamento das campanhas eleitorais e é usada para transmitir a imagem de que por serem indivíduos estabelecidos nos negócios têm maiores capacidades para mobilizar financiamento para a materialização do seu manifesto eleitoral. No entanto, a experiência tem mostrado que pode se tratar de um outro meio de enriquecimento através da utilização das oportunidades existentes para o financiamento das próprias empresas,