Sociedade

Crónica do silêncio radiofónico

Por Leonel Matusse Jr.

Diz-se que na Rádio Moçambique os colaboradores, esses guerreiros do microfone, decidiram ensaiar um acto heroico: ameaçaram denunciar — e, mais grave ainda, apresentar provas — de fraude eleitoral. Ora, a palavra provas costuma ter em democracias normais o peso de um piano caindo no meio de uma festa. Só que aqui, meus caros, nem piano nem festa.

Porque, veja-se, não só não houve o aumento que pediam como também lhes tiraram o bolo: a comemoração dos 50 anos da rádio. Imaginem a cena. Em vez de discursos solenes, brindes protocolares e fotografias sorridentes com ministros, sobraram apenas microfones desligados e funcionários com cara de quem foi convidado para a festa mas descobriu que o anfitrião comeu o bolo sozinho, na cozinha.

Num Estado de Direito de facto, desses que aparecem nos manuais, só a ameaça — repito, a ameaça! — já bastaria para pôr meio regime a tremer como cadeira de escola primária. Os opositores fariam fila para emprestar megafones, o partido no poder fingiria um debate interno, e a sociedade civil afinaria o coro em três vozes: indignação, repúdio e marcha na Baixa.

Mas quando a oposição cabe toda ela, senão no bolso, pelo menos na algibeira interior do casaco do regime, nada abana. O vento sopra, mas a árvore não se mexe. Acontece que, neste teatro, as provas viram rumor, os rumores viram boato, e o boato é arquivado como se fosse relatório confidencial. Resultado: silêncio.

E é nesse silêncio que estamos, caros ouvintes. Silêncio de rádio que não transmite festa, não transmite denúncia e, sobretudo, não transmite mudança.

Enfim, é só conversa. Daqui a pouco, a minha mãe vai ligar, não para perguntar pelas provas ou pelos 50 anos, mas para me perguntar porque insisto em escrever estas coisas, que só servem para me arranjar inimigos e para a família inteira franzir a testa no almoço de domingo.

Mas, como dizia Saramago, se a palavra incomoda, é porque a verdade anda por perto.

 

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