Thomashausen comentando os últimos desenvolvimentos das dívidas ocultas ao MediaFAX
O conceituado constitucionalista e professor de Direito Internacional Comparado da Universidade da África do Sul (UNISA), André Thomashausen, não tem a mínima dúvida da intenção criminosa no pagamento de um milhão de dólares a Filipe Nyusi e de 10 milhões ao partido Frelimo, pelo grupo Privinvest, a empresa do calote dos 2.2 mil milhões de dólares, isto na véspera da campanha eleitoral de 2014.
Nisto, entende o académico sul-africano, Armando Guebuza, Presidente da República na altura em que estavam a decorrer as transacções do negócio da protecção costeira ou simplesmente da Zona Económica Exclusiva, conseguiu usar a sua inteligência para lavar as mãos de forma antecipada, mandado o seu ministro da Defesa assinar os documentos do que hoje é considerada a maior burla envolvendo altos funcionários do Estado e Governo moçambicano
Com as coisas assim colocadas, conclui o académico, Filipe Nyusi tem a batata quente em suas mãos. Aliás, Thomashausen acredita que o actual Presidente da República continue ainda no poder graças às perturbações da Covid-19, que vão adiando infinitamente a reunião magna da Frelimo, isto apesar de muitas pessoas acreditarem que o assunto possa passar em branco na reunião do Comité Central, alegadamente porque “todos comeram” das dívidas ocultas. Ou seja, acredita-se que o partido no poder vai conceber arranjos para continuar a assobiar para o lado, evitando abordagens profundas do assunto.
Nas linhas abaixo, o breve comentário feito por André Thomashausen, a pedido do mediaFAX. – Que implicações político/governativas a repetição (já vem de Brooklyn) destas revelações podem acarretar, particularmente para o Presidente da República?
A grande lição para a Privinvest e seus parceiros nas teias do grande crime económico internacional é que a sociedade civil, a coragem dos jornalistas e a liberdade de expressão em Moçambique acabaram por frustrar os seus planos nefastos. Para eles, todos só restam a vergonha e o desprezo do mundo inteiro, simbolizado nas tristes imagens de 24 arrastões enferrujados e sucata, parados num caís no Maputo. Nunca pescaram um único peixe. E das 36 embarcações em fibra de vido que venderam para serviços de patrulha marítima a Moçambique, só foram entregues 6 unidades.
Será que as restantes 30 unidades foram parar no golfo da Guiné?
São barcos de alta velocidade equipados com metralhadoras, tipo “James Bond”, mas lá em Cabo Delgado só dão para divertir os seus pilotos. – A Privinvest continua a negar, entretanto, que os pagamentos sejam subornos.
Como colocar fronteira entre corrupção e simples contribuições ao partido Frelimo e seu candidato?
Da parte da Privinvest nunca houve contribuições inocentes, nem à Cruz Vermelha, nem ao partido Frelimo. A Privinvest é o rosto feio do capitalismo selvagem e não tem futuro. –
Até que ponto é aceitável a justificação de inimputabilidade do Presidente Filipe Nyusi, supostamente porque a lei abre espaço para os candidatos receberem apoios/donativos?
Pelo menos, é o que Caifadine Manasse disse à bloomberg. Pelo artigo 37 (3) da Lei Eleitoral, lei 2/2019, é proibido o financiamento de candidatos por governos estrangeiros ou empresas públicas estrangeiras. Assim as contribuições por parte de empresas e indivíduos particulares não são proibidas. Porém, segundo o artigo 40 da mesma lei, existe a obrigação da prestação de contas e as contribuições que o candidato Nyusi e o partido Frelimo terão recebido deveriam ter sido declaradas. Mas, claro, o facto de não terem sido declaradas confirma que nunca foram consideradas contribuições à campanha, nem foram investidas na campanha eleitoral. Tudo indica que da parte da Pivinvest esses pagamentos também não foram considerados contribuições a uma campanha eleitoral, mas sim pagamentos condicionados pela conclusão de encomendas comerciais. Ultimamente, a responsabilidade é política. A Assembleia e o partido Frelimo devem fiscalizar a conduta do Chefe de Estado colocado na sua posição pelo partido vencedor das eleições. A nação fica lesada se o seu chefe de Estado vendeu a pátria a interesses de traficantes de armas e burlões e o partido Frelimo é chamado a tomar as medidas necessárias para repor a boa reputação e a integridade da Nação. –
A Privinvest diz que se outros acusados receberam “subornos”, então deve, a PGR aceitar que Nyusi e a Frelimo também receberam subornos. O que isto lhe parece?
É uma indicação clara dos motivos da Privinvest. Esta empresa agiu com a intenção criminosa de subornar e nunca quis altruisticamente contribuir ao financiamento de campanhas eleitorais em Moçambique onde, nessa altura, não tinha presença alguma. Claro que os crimes de corrupção são proibidos a níveis nacionais, bem como internacionais e devem ser determinados e perseguidos sem favores para uns, e rigor para outros. – E a situacão de Armando Guebuza!? Ele voltou a ser ilibado.
Tem a mesma percepção? Até que ponto pode usar isso para ir ao ataque, visto que mantém uma relação de alguma fricção com o actual PR?
O antigo Presidente Guebuza muito obviamente agiu com a mente de quem “se lava as mãos”. Abraçou bem forte os burlões, mas não assinou. Mandou o seu Ministro Nyusi assinar. A batata quente está nas mãos de Nyusi e Guebuza está a saborear a possibilidade de ele cair. A única coisa que o mantém no poder é o vírus Covid-19, que serve como desculpa para continuar a adiar indefinitivamente a devida reunião do Comité Central da Frelimo. Tudo isso é bem triste e contrário ao patriotismo que Moçambique merece. (MediaFax)