Realizou-se recentemente uma conferencia na cidade de Pemba província de Cabo Delgado uma conferencia sobre os desafios do Estado no contexto da segurança privada na indústria extractiva e no conflito no norte de Moçambique
O evento foi organizado pelo Centro para Democracia e Direitos Humanos (CDD) em parceria com o Ministério da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos de Moçambique ‘ um marco importante para a viragem do foco, assente exclusivamente na actuação ou provi- são de serviços de segurança pelo Estado.”
Só na província de Cabo Delgado de acordo com Sifuena Anenge, representante do Ministério do Interior, existem 31 empresas de segurança privada, onde cinco não tem escritórios adequado, outras possuem armas não registadas pelas autoridades o que constitui uma violação da legislação aplicável (Decreto n.º 9/2007, de 30 de Abril – aprova o Regulamento das Empresas de Segurança Privada) e pode constituir um risco de segurança se forem desviadas para actos subversivos contra o próprio Estado.
As lacunas deixadas pelo estado dão espaço a proliferação de empresas de segurança privada bem equipadas, com melhores recursos onde o estado moçambicano pouco controla estas empresas na corrida pelas empresas internacionais do sector de segurança privada ramificados a escala global que são contratadas pelas empresas multinacionais pelo controlo da segurança privada em Moçambique.
Segundo organização do evento Moçambique vive momentos críticos na governação do sector de segurança desde a emergência e instalação dos grandes projectos de empresas multinacionais em Cabo Delgado. As Forças de Defesa e Segurança (FDS) não estiveram suficientemente preparadas para prover segurança aos grandes projectos multinacionais no norte de Moçambique e, para agravar a situação, eclodiu em Outubro de 2017 o conflito extremista violento que veio pressionar as FDS. Com efeito, este cenário abriu espaço para a instalação de empresas privadas de segurança internacionais contratadas pelas multinacionais. Trata-se de empresas que têm melhores condições de trabalho, de equipamentos e cobram receitas “chorudas”, cabendo ao Estado moçambicano apenas a tarefa de controlar a sua actuação, que raras vezes consegue fazer com a devida efectividade.
Outros exemplos são os do uso das forcas de segurança do estado para proteção das mineradoras como casos das concessões de rubis de Montepuez e outros onde proprietários/ sócios dessas mesmas empresas são membros do governo moçambicano
A Secção H do Quadro de Políticas da União Africana para a Reforma do Sector de Segurança em África chama atenção para o papel da sociedade civil africana na reforma do sector de segurança. O destaque vai para dois pontos essenciais: (i) promover o diálogo sobre questões de segurança entre os diferentes sectores da sociedade como uma medida de criação de confiança; (ii) promover e defender uma cultura de boa-governação, princípios democráticos, participação, liberdade e direitos humanos, bem como justiça social no sector da segurança1
Para além do contexto específico de investidores na indústria extractiva que contratam muitas empresas do sector de segurança privada, evidências mostram que em situações de conflito, muitas embaixadas e organizações internacionais também contratam esses serviços. São disso exemplos a ONU, PNUD, ACNUR, UNICEF, CARE, CARITAS e World Vision
De acordo com Oliveira (2010), citando Singer (2001/2002), “o ponto central na discussão sobre as empresas privadas de segurança é que os indivíduos, Estados e organizações internacionais dependem cada vez mais de serviços militares fornecidos pelo mercado privado e não por instituições públicas”.
Ao se ocuparem da segurança privada tanto para as empresas da indústria extractiva, assim como para outros tipos de clientes, as empresas de segurança privada levam em conta que a sua responsabilidade principal não é com os eleitores, nem com as instituições democráticas, mas com os accionistas das empresas e com os seus contratantes, o que limita a prestação de contas e responsabilização dos seus actos, como por exemplo para casos de violação de direitos humanos, onde o Estado não tem o devido controlo sobre essas empresas.
Em casos como o de Moçambique, que está a passar por conflito na região norte e enfrenta vários desafios na provisão de segurança e na implementação efectiva dos diplomas que regem o sector de segurança privada, a União Africana recomenda através do Quadro de Políticas para a Reforma do Sector de Segurança em África a implementação de uma Reforma do Sector de Segurança (RSS).
A RSS, de acordo com o Quadro citado, refere-se ao processo pelo qual os países formulam ou reorientam as políticas, estruturas e capacidades das instituições e grupos envolvidos no sector de segurança, no sentido de astornar mais eficazes, eficientes e sensíveis ao controlo democrático e às necessidades de segurança e justiça do povo. A maior parte das RSS em África surgem no âmbito da reconstrução pós-conflito. Este instrumento é importante porque coloca, para além das entidades estatais que fazem parte do sector de segurança, os órgãos de segurança não estatais, tais como as empresas de segurança privada.
Iniciativas como os Princípios Voluntários sobre Segurança e Direitos Humanos podem oferecer uma base sólida para o Governo de Moçambique melhorar a sua abordagem para a problemática do controlo da actuação das empresas de segurança privada. A União Africana reconhece que o sector de segurança deve ser objecto de revisão institucional regular, pelo menos uma vez em cada 10 anos. Além disso, as RSS devem integrar um esforço mais amplo de reformas e constituir um elemento essencial na prevenção de conflitos, nos esforços de pacificação, no período de recuperação imediato após conflito, na edificação e consolidação da paz, e nas agendas de desenvolvimento sustentável
Para a efectiva implementação dessas reformas, duas questões devem ser observadas: (i) Supervisão legislativa do sector de segurança que consiste em a Assembleia da República elaborar e aprovar leis, regras e regulamentos das instituições do sector de segurança, estabelecer e mandatar comissões especializadas para executar a supervisão em seu nome e para a manter regularmente informada; (ii) O controlo e a supervisão judicial que visam restringir o uso de poderes intrusivos do sector de segurança que não estejam estabelecidos na Constituição e demais leis. (Moz24/CDD